sexta-feira, 26 de maio de 2017

KANT – POLÍTICA, IMPOLÍTICA, LOUCURA

José Paulo
REVOLUÇÕES: POLÍTICA E IMPOLÍTICA

Para os leitores que ainda não se atinaram com a coisa as publicações nesses blog não são publicações de textos acadêmicos ou universitários. São somente gramaticalização científicas em narrativa lógica do inconsciente do discurso do político do maître na história da cultura da política universal. 

                                                                        I

Marx e Tocqueville expõe duas concepções de revolução moderna antagônicas?

A revolução em Marx em longa duração é a revolução econômica capitalista que se transforma em revolução ideológica gramatical como força prática as revoluções políticas. É o caso da Revolução Francesa.

Em Tocqueville, a Revolução Francesa como efeito da longa duração é uma longa duração da sociologia historial da política nacional democrática. Trata-se da necessidade da revolução democrática contra as velhas instituições podres e inúteis para a manutenção da Ordem Sociológica no Ancien Régime. 

O Velho regime é a transformação da política em impolítica, sendo este fenômeno a causa da necessidade da revolução democrática. Necessidade de substituir as antigas instituições carcomidas e inúteis para manter a Ordem na sociedade francesa. Foi uma catástrofe inevitável pois os ricos (aristocracia e burguesia), pois, eles não tinham como chegar a acordos e a um pacto para a mudança natural da soberania na cultura da política da sociedade aristocrática para a sociedade democrática. 
Toc nos permite pensar a revolução francesa como revolução permanente nacional moderna no campo das relações entre países, nações e impérios na Europa. A revolução com Napoleão torna-se uma força prática burocrática (Kraft der Praxis, die bürokratischen) que Marx registra no 18 Brumário:
“Torna-se imediatamente óbvio que um pais como a França, onde o Poder Executivo controla um exército de funcionário que conta mais de meio milhão de indivíduos e, portanto, mantém uma imensa massa de interesses e de existências na mais absoluta dependência; onde o Estado enfeixa, controla regula superintende e mantém sob sua tutela a sociedade civil, desde suas mais amplas manifestações de vida até suas vibrações mais insignificantes, desde suas formas gerais de comportamento até a vida privada dos indivíduos”. (Marx. 1974: 363).       

Tanto Marx como Toc. nos fazem ver a Revolução francesa não como revolução homo clausus local, ou nacional, mas como uma revolução articulada ao campo de poder kantiano europeu. A França da revolução democrática nacional moderna quer fundar um campo de poder mundial kantiano para a emancipação da humanidade, pois tratava-se de fundar a política moderna para tomar o lugar da impolítica tirânica do antigo regime aristocrático:
“desde o início de nossa história, tem determinado a própria existência da política, a causa da liberdade contra a tirania”. (Arendt: 9).

Hannah faz uma teoria geral da contrafação entre IMPOLÍTICA (ou polis da tirania ou da polis oligarquia) e a política tout court como política girando no eixo da liberdade. O ponto forte da Revolução bolchevique era a ideologia gramatical de luta em diversas formas de stásis (e depois guerra ou pólemos) contra o Ancien Régime tzarista, luta pela liberdade em vários graus.
Tal fato aparece claramente na brochura O Estado e a revolução que é uma promessa de Lenin de uma era de liberdade na Rússia jamais vista no planeta inclusive na América, pátria de uma revolução na qual a liberdade é a fonte de uma ideologia gramatical até hoje povoando os sonhos americanos, pois, nem Donald Trump pode fazer desaparecer tal ideologia gramatical revolucionária da liberdade.  
A Revolução francesa é a produção de uma NARRATIVA nacional democrática da modernidade como forma de articulação da hegemonia do campo de poder mundial na passagem de um campo hobbesiano para um campo kantiano liberal. O essencial da revolução francesa não é o fato como cem si inexplicável, mas a narrativa produzida posteriormente sobre o fato transformando-o em artefato narrativo da liberdade, portanto, da política. A política kantiana exige um campo de poder procedural público:
“Já como sábio, ao contrário, que por meio de suas obras fala para o verdadeiro público, isto é, o mundo, o sacerdote, no uso público de sua razão, goza de ilimitada liberdade de fazer de sua própria razão e de falar em seu próprio nome. Pois o fato de os tutores do povo (nas coisas espirituais) deverem ser eles próprios menores constitui um absurdo que dá em resultado a perpetuação de absurdos”. (Kant: 108).

Estes absurdos são parte da máquina de guerra psicótica delirante da cultura sacerdotal do tutor espiritual do povo! Em Kant, o espaço público procedural do uso público livre da razão é a gramaticalização do inconsciente do discurso do político do sacerdote.  Daí aos ataques à teologia e à metafísica como máquinas de produção de ideologias psicóticas delirantes é um pequeno salto:
“Mas, enquanto sábio, tem completa liberdade, e até mesmo o dever, de dar conhecimento ao público de todas as suas ideias, cuidadosamente examinadas e bem-intencionadas, sobre o que há de errôneo naquele credo, e expor suas propostas no sentido de melhor instituição da essência da religião e da Igreja” (Kant: 106), ou seja, do poder impolítico dominante como ideologia gramatical de toda uma época.

                                                                             II
A narrativa depois da revolução é um contraponto entre o uso público da razão e o uso privado da razão:
“O sacerdote proclama: não raciocineis, mas crede! (Um único senhor no mundo diz: raciocinai, tanto quanto quiserdes, e sobre o que quiserdes, mas obedecei!). Eis aqui por toda parte a limitação da liberdade” fazendo pendant com a impolítica. “Que limitação, porém, impede o esclarecimento [˂Aufklãrung>]? Qual não o impede, e até mesmo o favorece? Respondo: o uso público de sua razão deve ser sempre livre e só ele pode realizar o esclarecimento [˂Aufklãrung>] entre os homens. O uso privado da razão pode, porém, muitas vezes ser muito estritamente limitado, sem, contudo, por isso impedir notavelmente o progresso do esclarecimento [˂Aufklãrung>]. Entendo, contudo, sob o nome de uso público de sua própria razão aquele que qualquer homem, enquanto SÁBIO, faz dela diante do grande público do mundo letrado”. (Kant: 104).

A antítese razão versus loucura em Kant é da cultura da política médica das grandes figuras da loucura do século XVIII (Foucault: 251), sendo a demência a com mais efeito de realidade na sociedade médica a qual Freud associa o Dr. Schreber:
“Sob nomes diversos, mas que abrangem quase todos o mesmo domínio – dementia, amentia, fatuitas, stupiditas, morosis -, a demência é reconhecida pela maioria dos médicos dos séculos XVII e XVIII. Reconhecida e facilmente isolada entre as outras espécies mórbidas, mas não definida em seu conteúdo positivo concreto. Ao longo desses dois séculos ela persiste no elemento do negativo, sempre impedida de adquirir uma figura característica. Num certo sentido, a demência é, dentre todas as doenças do espírito, a que permanece mais próxima da loucura. Mas da loucura em geral, da loucura experimentada em tudo o que pode ter de negativo: desordem, decomposição do pensamento, erro, ilusão, não-razão e não-verdade”. (Foucault: 252).

Se a política da serpente e pomba é expressão da racionalidade da ordem do discurso da lei da sociedade política, a sociedade da demência é a impolítica como desordem enquanto falta de incivilidade, decomposição das ideias políticas práticas e do pensamento político abstrato, erro o mais grosseiro, ilusão delirantemente psicótica, no máximo a racionalidade estreita do interesse econômico homo clausus e, finalmente, a ausência total da verdade e/ou do verdadeiro na cultura da impolítica. Acompanhando a incultura da política do simulacro de simulação falta completa de valores próprio da política da serpente astuciosa, pois, não limitada pela moral da justiça da pomba (Sócrates).           
                                        
                                             KANT: POLÍTICA E IMPOLÍTICA

Aliás, pode até parecer pernóstico, pedante e elitista a ideia em tela kantiana. No entanto, ela faz pendant com a construção da narrativa da revolução após a revolução que assim se transforma em uma ideologia força prática gramatical invadindo e sendo absorvida pelo real da realidade ou mundo.

O papel do intelectual, ou seja, da classe governante (classe simbólica + classe política) é muito claro na revolução liberal kantiana. Ela deve se articular como moral e política:
 “A política diz: ‘sede astutos como as serpentes’. A moral acrescenta (como condição limitante): ‘e sem maldade, como as pombas’. Quando estas duas coisas não podem coexistir em um mesmo mandamento, há realmente um conflito entre a política e a moral; mas se ambas devem ser inteiramente unidas, o conceito contrário é absurdo e a questão de saber como resolver aquele conflito não se apresenta mais como problema”. (Kant: 130):    

A articulação da política serpente como tal é a impolítica; e a articulação do limite da política serpente pela moral pomba, aí, encontra-se a política liberal. A política como tal kantiana é o avesso da impolítica serpente kantiana 

Como fazer a revolução perdurara pela narrativa republicana liberal (se pp 114):
“Um Estado pode também já governar-se em forma de república, embora ainda possua de acordo com a constituição vigente, uma autoridade soberana despótica, até que o povo progressivamente se torne capaz de sofrer a influência da pura ideia da autoridade da lei (do mesmo modo como se a lei possuísse uma força física) e, por conseguinte, se encontre apto a dar a si mesmo uma legislação própria (fundada originalmente no direito”. Se também pela violência de uma revolução produzida por uma má constituição fosse conquistada, de maneira ilegítima, uma constituição mais de acordo com a lei, não deveria, também, entretanto ser considerado permitido reconduzir o povo novamente à constituição anterior, embora durante a primeira qualquer indivíduo que tenha tomado parte dela, violenta ou astuciosamente, deva ser submetido com razão aos castigos dos rebeldes”. (Kant: 136).  

 A lei como força prática ideológica gramatical liberal faz pendant com o espaço procedural público:
“A liberdade de pensar opõe-se em primeiro lugar a coação civil. Sem dúvida ouve-se dizer: a liberdade de falar ou de escrever pode nos ser tirada por um poder superior, mas não a liberdade de pensar. Mas quanto e com que correção poderíamos nós pensar, se por assim dizer não pensássemos em conjunto com os outros, a quem comunicamos nossos pensamentos, enquanto eles comunicam a nós os deles! Portanto, podemos com razão dizer que este poder exterior que retira dos homens a liberdade de comunicar publicamente seus pensamentos rouba-lhes também a liberdade de pensar, o único tesouro que ainda nos resta apesar de todas as cargas civis, e graças ao qual unicamente pode ainda ser produzido um remédio contra todos os males da situação”. (Kant: 93-94).           

No entanto, a narrativa da liberdade (da política moderna liberal) é objeto de todo tipo de obstrução:
 “Mesmo quando os conceitos da razão só querem fundar uma obrigação legal apenas e de acordo com os princípios da liberdade, pela qual unicamente é possível uma constituição do Estado válida de direito”. (Kant: 138).

Tal fenômeno em tela é a saída da minoridade de uma espécie de servidão voluntária ao discurso do político do maître contra o qual o Esclarecimento luta sem descanso:
“Esclarecimento [˂Aufklãrung>] é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento [˂Aufklãrung>]. 

                                                                 III

 Como o esclarecimento e o espaço procedural de comunicação pública entre os homens, o homem que sai de sua minoridade na era moderna saí como classe simbólica que surge contra a vigilância e a repressão: “ à luz da história subsequente do trabalho da polícia ideológica”. (Darnton. 1986: 193). Onde houver classe simbólica em maioridade haverá polícia ideológica para desarticular o trabalho daquela pela república liberal como tal moderna.

A classe simbólica em maioridade é a possibilidade do discurso do político do liberal que desossa o delírio psicótico e seus absurdos sobrea política e na articulação da política da serpente:
“Já como sábio, ao contrário, que por meio de obras fala para o verdadeiro público, isto é, o mundo, o sacerdote, no uso público de sua razão, goza de ilimitada liberdade de fazer uso de sua própria razão e de falar em seu próprio nome. Pois o fato de os tutores do povo (nas coisas espirituais) deverem ser eles próprios menores constitui um absurdo que dá em resultado a perpetuação dos absurdos”. (Kant: 108).

Uma classe simbólica gramatical minoritária, conscientemente, por covardia ou preguiça, como tutora das massas gramaticais é a causa mais certa da difusão do delírio psicótico como fantasia de articulação do cotidiano da política da serpente. 

No Brasil, a impolítica do modo de produção da cultura da política do coronel do sertão de Guimarães Rosa crê que o alvo da polícia ideológica deva ser o sacerdote digitalis.

A diferença entre a política e a impolítica está no vínculo da política com a moral e a ideia de direito como fonte territorial da subjetividade do território gramatical da liberdade:
“A verdadeira política, portanto, não pode dar um passo sem antecipadamente ter prestado homenagem à moral (da pomba socrática), e embora a política em si mesma seja uma arte difícil, a união dela com a moral não constitui uma arte, pois a última corta o nó górdio que a política não consegue desatar, quando ambas entram em conflito uma com a outra. O direito do homem deve ser considerado sagrado, por maiores que sejam os sacrifícios que custem ao poder dominante”. (Kant: 152).   

A moral da pomba na política da serpente é a ideia de moral fazendo pendant com a ideia de justiça (justo) em Sócrates no livro A República- não prejudicar. Trata-se do anverso da ideia e justiça de Homero, de Somonide e do sofista. (Platon: 866-867)
- Donc faire du bien aux amis, du mal aux ennemis, c’est là que Simonide entend par justiçe? – A mon avis”> (Platon: 864). Esta é a justiça fazendo pendant com a política da serpente do modo de produção da cultura da política oligárquico do coronel urbano-rural brasileiro! 

Em Sócrates: “En verité, pourtant, les bons sont de homens justes et incapables de commettre une injustice? – Cést la verité”. Platon: 867). De fato, se trata de não prejudicar o amigo nem o inimigo, de não prejudicar, simplesmente. Esta fórmula se encontra na Edição do A Republica, em português, de um modo claro:
“Logo, não é obra própria do justo o causar dano a um amigo ou a qualquer outro, e sim do seu contrário, o injusto”. (Platão: 23). Justo é a política que é a gramática em narração lógica: não prejudicar ninguém. 
  
                                                                                 IV

A narrativa liberal-democrática tem necessidade do filósofo e do homem das belas letras como classe simbólica em estado de maioridade, ou seja, como força prática ideológica gramatica como culto desejado pelo intelectual da maioridade:
“Aqui outra vez, celebrou o homem de letras como o guerreiro solitário, na luta pela civilização, e prosseguiu emitindo uma declaração de independência para a gens de lettres como grupo social” (Darnton. 1986: 268). Trata-se da luta da classe simbólica do esclarecimento na cultura da política por uma ideia de justiça associada a maioridade, e, portanto, a abolição da ideia da produção sob o mandato de um tutor, o discurso do político do senhor do absolutismo. Daí a necessidade de o estado absolutista criar a polícia ideológica como contrapeso a luta do intelectual pela maioridade cultural e simbólica.     

Napoleão temia os ideólogos (grupo como o qual ele tivera contato), porque não sabe que sabe da força prática das ideias revolucionárias modernas nacionais democráticas no jogo do campo de poder hobbesiano europeu e americano.

A narrativa da articulação da hegemonia europeia francesa tinha necessidade de destruir o baluarte continental do Ancien regime aristocrático na Europa. Assim, as guerras napoleônicas eram inevitáveis e uma necessidade em longa duração sociológica da história da cultura da política da liberdade e da democracia na versão francesa napoleônica.

Marx pensou a guerra napoleônicas contra a Rússia como a revolução do modo de produção do burguês francês levado à economia rural tradicional russa. Revolução do urbano contra o rural. Tocqueville pensa a revolução das guerras napoleônicas como a expansão em escala ampliada da revolução política francesa. A derrota francesa na guerra com o czarismo definiu o curso da revolução europeia que acabou em 1917 dando um salto do Ancien Régime para o socialismo bolchevique. A Rússia nunca soube, de fato, o que é uma revolução moderna democrática nacional.

A vitória da Rússia impediu a criação de um campo de poder mundial kantiano no início do século XIX na Europa, ou seja, um território de relações entre nações fundado na política ao invés de se fundar na impolítica.  
                                                                                         
Na revolução para fazer a passagem da impolítica para a política, a relação entre o intelectual e a nação é essencial. A criação da sociedade do escritor na França do século XVIII (Darnton) transportou a política para os hábitos da literatura e a literatura passou a fazer pendant com a política. Daí a cultura deixa de ser remetida à hábitos, costumes e crenças e se torna a cultura da política econômica feita por uma literatura, com alto grau de abstração, do filósofo e do homem de letras, e do economista:
Tocqueville diz:
“Os filósofos não deram apenas suas ideias ao povo que a fez (a Revolução): deram-lhe seu temperamento e eu humor. Sob sua longa disciplina, à falta de quaisquer outros líderes, no meio da ignorância profunda em que vivia no cotidiano, toda a nação, ao lê-los, terminava por contrair seus instintos, sua inclinação espiritual, o gosto e até os cacoetes próprios aos que escrevem. De sorte que, quando ela começou a atuar, transportou para a política todos os hábitos da literatura”. (Aron: 246).

Na Rússia czarista, a revolução que destruiria o czarismo seria aquela da classe simbólica sob comando dos intelectuais marxistas.

A classe simbólica significa a produção de uma literatura abstrata sobre primeiro sobre a França, depois sobre a Europa e na Rússia onde se destaca o fenômeno da literatura abstrata marxista e a escola de Lenine da articulação da interpretação abstrata com o método análise concreta de situações concretas. Na Rússia, a literatura marxista foi o aspecto principal da unidade teoria e prática. A literatura marxista se transformou em uma ideologia gramatical como força prática bürokratische da sociedade e do Estado com a revolução stalinista. Tal força prática bürokratische invade o real deixando um rastro de rios de sangue camponês, sangue da classe simbólica do terror do Estado bürokratische, fenômeno que o mundo só veio a tomar conhecimento décadas depois do acontecimento. 

A ciência abstrata e a classe simbólica foram determinantes na produção da ideologia gramatical stalinista abstrata força prática   bürokratische de abstração da realidade que significa a destruição da sociedade civil tradicional russa e a construção de um Staatliche bürokratische post-kapitalistischen, do qual Hitler nutria sentimentos de ódio e amor: de aversão sexual, inveja e desejo sexual intenso. 

A IMPOLÍTICA da modernidade adquire sua forma completa como o Urstaat comunista populista de Stalin fazendo pendant com o Estado hitleriano.

O nazismo perdeu a II Guerra, então, por que inúmeros autores escrevem no pós- 1947 dizendo que o totalitarismo se apossou da América democrática liberal?

Tal sociedade totalitária americana não explica a soberania do Staatliche bürokratische post-kapitalistischen no século XXI como criminostat periferia lacaniano R.S.I?

                                                                          SEGUNDA PARTE
                                                           LOUCURA E REVOLUÇÃO – NORMAL E PATOLÓGICO
                                                            
                                                                       MESMER E SCHREBER 

Enquanto Schreber tem seu nome ligado à história da loucura via a leitura que Freud fez do Memórias de um doente dos nervos, Mesmer é visto como parcela da cultura da política popularesca ligada ao choque com o Ancien Régime:
“Os mesmeristas radicais expressavam a sensação dos seus contemporâneos de que o Ancien Régime havia decaído para além da possibilidade de uma recuperação natural. Era necessária uma grande intervenção cirúrgica, e não se poderia confiar nos médicos da corte para executá-la. Os mesmeristas assumiram a tarefa, armados por sua própria medicina e conseguiram infligir alguns profundos sofrimentos; mas, depois da morte da antiga ordem, viram que a sua união se devia a um desejo comum de transformação, e não objetivos claramente definidos, e viraram-se uns contra os outros”. (Darnton. 1988: 142).
    
O mesmerismo fez pendant com a cultura da política popularesca científica do maravilhoso (absurdos para Kant) que ajudou a elite revolucionária com as ideias dele delirante psicóticas a pôr um fim no poder europeu da aristocracia na França:

O mesmerismo também atraiu alguns privilegiados, homens como Lafayte, Duport e d’Eprémesnil, que flertavam com ideias que socavavam sua elevada posição social. Esses homens defendiam o mesmerismo como uma medicina do povo simples, uma ciência que restauraria os saudáveis primitivos de Rousseau e Court de Gébelin. A saúde geraria virtude, a virtude descrita por Rousseau e Montesquieu, e a virtude geraria harmonia no corpo político e nos indivíduos. O mesmerismo regeneraria a França destruindo os ‘obstáculos’ à ‘harmonia universal’; remediaria os efeitos perniciosos das artes (outra ideia adaptada de Rousseau) restabelecendo uma sociedade ‘natural’ onde as leis físico-morais da natureza afogariam os privilégios aristocráticos e o governo despótico num mar de fluído mesmérico. Os primeiros a ir, evidentemente, seriam os médicos. O programa da revolução mesmerista a seguir tornava-se vago, mas sua posição central mantinha-se clara: a eliminação dos médicos poria em movimento as leis naturais para erradicar todos os abusos sociais, pois o despotismo dos médicos e seus aliados acadêmicos representava a última tentativa de preservação da velha ordem contra as forças da verdadeira ciência da natureza e da sociedade”. (Idem: 141-142).

A ideia central de Mesmer é uma ideia delirante a altura das ideias delirantes de Schreber. Mesmer diz:
“Em fevereiro de 1778, Franz Anton Mesmer chegou a Paris e anunciou sua descoberta sobre um fluido ultrafino que penetrava e cercava todos os corpos. Mesmer não vira realmente esse seu fluido; chegou à conclusão de que ele devia existir como o meio para a ação da gravidade, visto que os planetas não poderiam se atrair num vácuo. Além de imergir todo o universo nesse ‘agente da natureza’ primordial, Mesmer trouxe-o para à Terra, a fim de abastecer os parisienses com calor, luz, eletricidade e magnetismo, e exaltou particularmente sua aplicação na medicina. Ele sustentava que a doença resultava de um ‘obstáculo’ ao fluxo do fluído através do corpo, o qual se assemelhava a um imã. As pessoas poderiam controlar e fortalecer a ação do fluído ‘mesmerizando’ ou massageando os ‘polos’ do corpo, e com isso superar o obstáculo, induzir uma ‘crise’ muitas vezes sob a forma de convulsões, e restaurar a saúde ou a ‘harmonia’ do homem com a natureza”. (Idem: 13-14).       

Freud fala de Schreber como um louco que conseguiu convencer a sociedade alemã de que ele Schreber não era louco:
“Nas numerosas solicitações aos tribunais, através das quais o Dr. Schreber esforçou-se por recobrar a liberdade, não repudiou de modo algum seus delírios ou fez qualquer segredo da intenção de publicar as Denkwürdigkeiten. Pelo contrário, estendeu-se sobre a importância de suas ideias para o pensamento religioso e sua invulnerabilidade aos ataques da ciência moderna; mas, ao mesmo tempo, dava ênfase à ‘absoluta inocuidade (430) de todas as noções que, como se dava conta, seus delírios obrigavam-no a realizar. Na verdade, tais eram sua perspicácia e a força convincente de sua lógica, que finalmente, e apesar de ser ele paranoico reconhecido, seus esforços coroaram-se de sucesso. Em julho de 1902, os direitos civis do Dr. Schreber forma restabelecidos e, no ano seguinte, suas Denkwürdigkeiten eines Nervenkranken apareceram, embora censuradas e com muitas partes omitidas”. (Freud. v. XII: 31).

 O que Freud não foi capaz de entender foi o êxito da autogramaticalização em narrativa lógica do inconsciente do discurso do político do Dr. Schreber. Porém o tribunal a metabolizou e cedeu a liberdade a Schreber por esse triunfo da razão gramatical sobre a loucura desse herói tão mal visto (e tratado como o homem-lobo em um jardim da Babilônia de Nabucodonosor) pelo campo freudiano, até os dias atuais.

O ponto culminante delirante de nosso herói é assim relatado:
“Para uma descrição mais pormenorizadas de seus delírios, tal como apareceram em sua forma final, podemos recorrer ao Relatório do Dr. Weber. O ponto culminante do sistema delirante do paciente é a sua crença de ter a missão de redimir o mundo e restituir à humanidade o estado perdido de beatitude. Foi convencido a essa tarefa, assim assevera, por inspiração direta de Deus, tal como aprendemos que foram os Profetas; pois, os nervos , em condições de grande excitação, assim como os seus estiveram por longo tempo, têm exatamente a propriedade de exercer atração sobre Deus – embora isso signifique tocar em assuntos que a fala humana mal é capaz de expressar, se é que o pode, visto jazerem inteiramente fora do raio de ação da experiência humana e, na verdade, terem sido revelados somente a ele”. (Idem: 32).

Freud se refere a esses tipos de ideias como ideias de um pensamento específico. Trata-se da teologia psicológica. Tal teologia psicológica põe no centro do debate o lugar da mulher na periferia RSI (Real/Simbólico/Imaginário):
“A parte mais essencial de sua missão redentora é ela ter de ser precedida por sua transformação em mulher. Não se deve supor que ele deseje ser transformado em mulher; trata-se antes de um ‘dever’ baseado na Ordem das Coisas, ao qual não há possibilidade de fugir, por mais que, pessoalmente, preferisse permanecer em sua própria honorável e masculina posição na vida. Mas nem ele nem o resto da humanidade podem reconquistar a vida do além, a não ser mediante a transformação em mulher (processo que pode ocupar muitos anos ou décadas), por meio de milagres divinos”. (Idem: 32).

Se este escrito de Schreber fosse contemporâneo da discussão de Lacan sobre o homem como totalidade fálica e a mulher como não-todo constituindo uma razão antitética da inexistência de relação sexual; se o escrito fosse da era do movimento da mulher que começa na década de 1960; então a mulher como parcela do além é o não-todo como parte da periferia simbólico. Nesse sentido, o dito de Schreber sobre a transformação da humanidade em mulher (como parte da redenção da humanidade) não evoca Goethe (pp 59):

Mefistófeles
                                 Sou parcela do Além,
   Força que cria o mal e também faz o bem! (Goethe: 59)

Assim, como Mesmer o foi na França da Revolução francesa, Schreber seria integrado à cultura da política mundial da revolução da mulher (parcela do Além) no século XXI, como aquele que não para de e inscrever na nova ordem simbólica mundial.

Hoje, homens desejarem se transformarem em mulher não é mais classificado, e tratado, como caso policial de psicose paranoide delirante.

Para não deixar só Freud falando por Schreber, vejam o texto delirante seguinte do próprio Schreber:
“Além da língua humana habitual há ainda uma espécie de língua dos nervos, da qual, via de regra, o homem não é consciente. Em minha opinião, a melhor maneira de ter uma ideia disso é recordar os procedimentos pelos quais o homem tenta gravar na memória certas palavras numa determinada sequência, como, por exemplo, quando um estudante, decora uma poesia que precisa recitar na escola ou um padre decora o sermão que tem de dizer na igreja. As palavras em questão são então repetidas em silêncio (como em uma oração silenciosa que do púlpito se exorta os fiéis a fazer), isto é, o homem incita seus nervos a induzir as frequências vibratórias correspondentes ao uso das palavras em questão, ao passo que os instrumentos próprios da linguagem (lábios, língua, dentes etc.) não são postos em movimento ou o são apenas casualmente”. (Schreber: 61).      

Na metafísica, encontramos muitos textos que se assemelham com o supracitado. Do campo da filosofia, Monica David-Ménard diz:
“Quando ele [Kant] retoma em 1781 o tema da redefinição da filosofia como ciência do limite da razão humana, a questão da relação com Swedenborg não é mais mencionada; o debate este último é substituído pelo debate com a metafísica. Mas todos os termos que caracterizavam o ocultismo – loucura, delírio, alucinação – servem agora para qualificar a metafísica”. (David-Ménard: 22-23).

E em seguida ela se interroga:
“a Crítica da razão pura distingue duas formas do impossível: o contraditório puramente lógico e o que ‘sem ser impossível no sentido da contradição não pode ser contado entre os possíveis’. Deste, há duas formas: o númeno leibniziano e as forças fundamentais que Swedenborg forjava ao admitir a existência dos espíritos, a transmissão de pensamento e a predição do futuro. O fato de o nome de Swedenborg não se pronunciado ao lado do de Leibniz não impede que aí a estrutura do problema do impossível se refira explicitamente ao pensamento visionário, e à perigosa vizinhança do númeno com os espíritos dos mortos”. (Idem: 27).

 Do contraditório como terapêutica de libertação,                  
Fernando Pessoa considera a “coerência, a convicção e a certeza são além disso, demonstrações evidentes – quantas vezes escusadas – da falta de educação”. Pois: “Se há um fato estranho e inexplicável é que uma criatura de inteligência e sensibilidade se mantenha sempre sentado sobre a mesma opinião sempre coerente consigo próprio”. (Pessoa: 581).

A ideologia gramatical na esfera da política produz essa espécie de sujeito gramatical falta de educação do fernandismo mesmo com o mundo dele desabando a sua volta ou em ruínas. Trata-se claramente de uma forma de loucura artificial da qual o sujeito só se livra quando é quebrado com a spaltung da ideologia gramatical do fernandismo falta de educação.

Na cultura da política mundial: “Certos estados de alma da luz, certas atitudes da paisagem têm, sobretudo quando excessivos, o direito de exigir a quem está diante deles determinadas opiniões políticas, religiosas e artísticas, aqueles que eles insinuem, e que variarão, como é de entender, consoante esse exterior varie. O homem disciplinado e culto faz de sua sensibilidade e de sua inteligência espelhos do ambiente transitório: é republicano de manhã, e monárquico ao crepúsculo; ateu sob um sol descoberto, é católico ultramontano a certas horas de sombra e de silêncio; e não podendo admitir senão Mallarmé àqueles momentos do anoitecer citadino em que desabrocham as luzes, ele deve sentir todo o simbolismo uma invenção de louco quando, ante uma solidão de mar, ele não souber mais do que a da ‘Odisséia’. (Pessoa: 581).

Além de ser um modo de escapar do determinismo lacaniano o sujeito é efeito do significante-metre, o sincretismo gramatical do sujeito parece o caminho mais óbvio para enfrentar o estado do louco permanente da ideologia gramatical que como uma peste domina a humanidade durante centenas ou até milênios de anos estabelecendo o discurso delirante do político do louco:
“Convicções profundas, só as têm as criaturas superficiais. Os que não reparam para as coisas quase que as vêem apenas para não esbarrar com elas, esses são sempre da mesma opinião, são os íntegros e os coerentes. A política e a religião gostam d’essa lenha, e é por isso que ardem tão mal ante a Verdade e a Vida”. (Idem: 581-82).

A política do íntegro e do coerente é aquela da oligarquia colonial brasileira da atualidade (e de toda forma de oligarquia que se ampare na escola sofista de Platão) sempre da mesma opinião: Donc faire du bien aux amis, du mal aux ennemis,  c’est là que Simonide entend par justice? – A mon avis” (Platon: 864).

Porém quando a política do íntegro e coerente entra em crise ela faz o mal ao amigo e bem ao inimigo! E então toda a possibilidade da normalidade dos que se atem a mesma opinião do mesmo vai para o cafundó do judas que perdeu as botas tentando fugir da cruz, ou da forka!   

ARON, Raymond. Les étapes de la pensée sociologique. Paris: Gallimard, 1967
ARENDT, Hannah. Da revolução. SP/Brasília: Ática/UNB, 1988
DARNTON, Robert. O lado oculto da revolução. Mesmer e o final do Iluminismo na França. SP: Companhia das letras, 1988
 DARNTON, Robert. O grande massacre de gatos e outros episódios da história cultural francesa. RL: Graal, 1986
DAVID-MÉNARD, Monique. A loucura na razão pura. Kant, leitor de Swedenborg. SP: Editora 34, 1996
FOUCAULT, Michel. História da loucura. SP: Perspectiva, 1978
FREUD. Obras Completas. v. XII. Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de paranoia (Dementia paranoide). [1911]. RJ: Imago, 1969
GOETHE, J. W. Fausto & Werther. SP: Nova Cultural, 2002
KANT, Immanuel. Textos Seletos. Petrópolis: VOZES, 1885
MARX, Karl. Os Pensadores. SP: Abril Cultural, 1974
PESSOA, Fernando. Obras em Prosa. Volume único. RJ: Nova Aguillar, 1986
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SCHREBER, Daniel Paul. Memórias de um doente de nervos. SP: Paz e Terra, 2010

         

                                                                             


                    
                                               
  
   
   

   
  
  

     

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