quarta-feira, 14 de junho de 2017

A CRISE DA CULTURA DA POLÍTICA - PLATÃO, LACAN, GRAMSCI


José Paulo

                                                                TEORIA  DA GRAMÁTICA POLÍTICA

No capítulo O Mundo Abandonado, Platão organiza uma teoria da política mitológica que servirá à teoria política do Rei. Gramaticalizar este capítulo pode ser muito útil para a teoria do poder real das ciências gramaticais da política?

Deus é a divindade superior que governa o mundo. Ele é o significante gramatical mestre (Sg1). O Sg1 governa o todo, pois, os deuses locais (significantes gramaticais locais Sg2, Sg3 etc.) governam as partes do mundo da política. Deus governa o mundo no início, antes do mundo começar a governar a si próprio com a memória de que a cultura está no comando da política.

A cultura no comando da política é a cultura da política econômica articulada em um bloco histórico cultural. Trata-se da articulação da hegemonia como direção moral e intelectual sobre povo, nação e a sociedade civil no mundo-da-vida. O Sg1 governa a cultura como totalidade e os significantes gramaticais (Sg2, Sg3 etc.) governam as partes da cultura articulados em blocos culturais locais. A territorialização e atualização da cultura do todo nacional virtual em blocos locais culturais se movem pelo princípio da semelhança e da ordem entre eles na forma política, sendo resguardado as diferenças locais culturais.   

Com o desenvolvimento da história nacional fazendo pendant com a história mundial no ciberespaço, o bloco histórico cultural nacional perde efeito de realidade e, por consequência, os blocos culturais locais esquecem o sentido do governo do mundo nacionalmente. Tal fenômeno ocorre em uma época na qual o Sg1 deixou ao mundo político o governo de si próprio. Daí vem o esquecimento do que seja articulação moral e intelectual do mundo da política e seu efeito significativo. CORRUPÇÃO do espaço da política por   falta da memória gramatical da cultura no comando da política. Corrupção em um sentido grego, ou seja, corrosão da forma política. Assim, a política como serpente (astúcia, violência simbólica sem limite, sgrammaticatura) deixa de ser governada pela pomba socrática e seu desejo amoroso de justiça: política da politeia = não prejudicar.

O desejo sexual de justiça da serpente é dar o bem ao amigo (amante) e o dar o mal ao inimigo. Tal gramática em narração lógica do mundo que governa a si próprio equivale ao governo oligárquico no qual os significantes gramaticais locais se feudalizam culturalmente e deixam de se inscrever no todo (Sg1):
“Por esse motivo, o Deus que o organizou (o mundo) compreendendo o perigo em que o mundo se encontra, e temendo que tudo se dissolva na tempestade e desapareça no caos infinito da dessemelhança, toma de novo o leme e recompondo as partes que, neste ciclo, percorrido sem guia, tombaram em dissolução e desordem, ele o ordena e restaura de maneira a torná-lo imortal e imperecível”. (Platão: 227).

A dessemelhança das partes é a falta de gramática em narrativa teológica da articulação da hegemonia local. A narrativa da hegemonia é criada em Sg1 nacional fazendo pendant com a narrativa do mundo planetário e com as narrativas locais. Se o mundo da política governa a si próprio sem direção intelectual e moral, há a possibilidade de partes atualizarem textos virtuais dessemelhantes que trazem a desordem (e a corrupção no sentido da teoria política grega da antiguidade) na articulação dos blocos culturais locais. Aí, então, a política tout court se torna o governar o mundo como um dos impossíveis freudianos ao lado do ensinar e do psicanalisar (Freud:282).
Partindo da ideia de um bloco histórico cultural do bolivariano de FHC/Lula/Hugo Chaves que se constituiu na América Latina, onde blocos culturais locais governavam países (incluindo o Uruguai, Bolívia, Equador), o Sg1 é o bolivariano, ou melhor, o espaço da cultural da política do econômico latino-americano.

Com a morte de Hugo Chaves, o bloco local venezuelano perdeu um pedaço do todo, ou melhor, Sg1 bolivariano começou a se autodissolver com a desintegração do bloco cultural local-universal venezuelano. A partir de então, o bolivariano cai no caos infinito da dessemelhança que passou a pesar como chumbo no cérebro de Dilma Rousseff. Foi neste momento da corporalização da dessemelhança (e da consequente desordem de articulação da hegemonia continental) entre os blocos locais de países do Sg1bolivarino que o mundo político do bolivariano começou a se governar esquecendo a cultura no comando da política.

 Deixo ao autor anônimo coletivo Wikipédia o relato sobre a articulação da hegemonia do bolivariano personificada em Hugo Chaves:
“Chávez foi vítima de uma tentativa golpe de Estado em 2002, com apoio do governo dos Estados Unidos. Apesar de o governo norte-americano ter usado de sua influência para obter o reconhecimento imediato do novo governo, a comunidade internacional – inclusive o Brasil, então governado por Fernando Henrique Cardoso – condenou o golpe. Chávez acabou voltando ao poder três dias depois. No final do mesmo ano, mediante um referendo revocatório, a população foi chamada a opinar sobre sua permanência na presidência. Chávez venceu o referendo sem dificuldade, ampliando assim a sua base política de apoio.

Inconformados, os líderes da oposição boicotaram as eleições parlamentares, no sentido de deslegitimar os eleitos e, assim, os futuros atos do Poder Legislativo. Essa manobra não teve o resultado esperado e acabou por dar a Chávez uma tranquila maioria no parlamento. Apesar de se ter afastado da vida parlamentar por decisão própria, a oposição passou, então, a acusar Chávez de monopolizar o poder - já que tinha de fato a maioria na Assembleia Nacional - e de nomear aliados para o Supremo Tribunal de Justiça. Além disso, a oposição também criticava o controle do Banco Central e da indústria petrolífera do país pela Presidência da República. Outros inimigos acusavam Chávez de perseguir adversários políticos e de pretender instaurar uma ditadura do proletariado na Venezuela. Realmente, Chaves se declarava abertamente marxista, inclusive como seguidor de Rosa Luxemburgo.

Já no plano externo, Chávez notabilizou-se por adotar um discurso anti-imperialista, antiamericano e anticapitalista. Apoiou a autossuficiência econômica, defendeu a integração latino-americana, a cooperação entre as nações pobres do mundo e protagonizou a criação da UNASUL, da ALBA, do Banco do Sul e da rede de televisão TeleSUR, além de dar apoio financeiro e logístico a países aliados.

Segundo o governo Bush, Chávez era uma ameaça à estabilidade da América Latina. Observadores internacionais, como Jimmy Carter e a ONG Human Rights Watch, criticaram o autoritarismo do presidente venezuelano, embora Carter tenha ponderado que Chávez trouxe uma transformação necessária ao permitir que parcelas excluídas da população tivessem participação mais equitativa da riqueza nacional. O venezuelano também foi criticado por adotar, após o malogrado golpe de 2002, "políticas que minaram os direitos humanos" no país.

Apesar de ser muito criticado pelos grandes veículos de imprensa da Venezuela e do exterior, e de adotar uma postura desafiante em relação aos Estados Unidos, muitas nações e povos simpatizaram com sua ideologia gramatical marxo-bolivariano, com as políticas sociais do seu governo e com sua política externa, voltada à integração latino-americana e às relações sul-sul, mediante incremento de trocas bilaterais e acordos de ajuda mútua”.

Neste trecho em tela é indubitável que Hugo Chaves era o líder da articulação da hegemonia marxista do bolivariano no concerto das nações. Próximo de Hugo, Lula aparecia como segundo no comando do bloco histórico cultural do bolivariano.

Dilma Rousseff se sentia segura como líder do bloco local cultural brasileiro. Sua ideologia gramatical manifestamente nacional desenvolvimentista (virtualmente inscrita no livro de Guido Mantega) durante seu primeiro governo, virou em uma rotação em sentido contrário (ao de sua ideologia latente nacional desenvolvimentista socialista de Estado) em seu segundo governo. Tal fato se deve ao mundo político bolivariano ter passado a se governar esquecendo a cultura marxo-latino do bolivariano no comando da política bolivariana. O câncer de Hugo significou a instalação da dessemelhança (e desordem) nos blocos locais levando Dilma para a seara da ideologia gramatical neoliberal regressiva tardia.

O fim do Sg1 bolivariano abriu a janela para os ataques ao governo local de Dilma Rousseff. Ela acabou caindo do governo, mas se manteve como biografia viva da memória do bolivariano, como esperança para os restos fragmentados do bolivariano na América Latina. Também introduziu o caos infinito da dessemelhança entre as nações das Américas, Donald Trump no comando do poder americano aos pedaços.

Donald ampliou e intensificou o caos infinito da dessemelhança e desordem locais, por países, nas Américas. A américa não é mais o Sg1 tradicional do continente americano como um mundo governado pelo capitalismo. O Sg1 comunismo do bolivariano esfarelou-se no ar em mil pequenos fragmentos de uma ideologia gramatical em fuga do real do continente americano e de uma ponta da Europa: Espanha.

Sei que este modo de entender/explicar a crise latino-americana fazendo pendant com a crise da América é propriamente amoderna e surpreendentemente antiacadêmica. Ela é extramuros universitária. Sei que é incomum articular Lacan e Gramsci quanto mais ambos com Platão. Sei que tal modo operandi teórico/prático me deixa do lado de fora dos muros da fortaleza da cultura brasileira na universidade, nas grandes mídias (papel, eletrônica, digital).
O que fazer se minha alma (almour) me conduz por esses caminhos inusitados da cultura ocidental e das Américas?

FREUD. Obras Completas. Análise terminável e interminável (1937). RJ: Imago, 282
MANTEGA, Guido. A economia política brasileira. SP/RJ: Polis/Vozes, 1984
PLATÃO. Político. Pensadores. SP: Abril Cultural, 1972

       



               

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